Dra Luciara Batista — Ginecologista e Obstetra

Toxoplasmose na gravidez

toxoplasmose

A gravidez é um momento muito importante para toda mulher. Por conta disso, diversos cuidados devem ser tomados para garantir a saúde da nova mamãe e do bebê e um deles é a prevenção da toxoplasmose. Sua infecção não apresenta sintomas na grande maioria dos casos, porém está associada a grande morbidade durante a gestação.

O agente etiológico, o protozoário Toxoplasma gondii, é um parasita com ciclo biológico de duplo hospedeiro. O gato é o hospedeiro definitivo. Outros mamíferos e aves são hospedeiros intermediários, abrigando o ciclo proliferativo.

O Toxoplasma apresenta três estágios principais de desenvolvimento. Os taquizoítos causam lesão tecidual na infecção aguda, com multiplicação rápida. Os bradizoítos formam os cistos teciduais persistindo no hospedeiro por muitos anos. Os esporozoítos são as formas eliminadas nas fezes dos felinos.

A transmissão da toxoplasmose pode ocorrer pela ingestão de oocistos por contato direto com fezes de gato ou manipulação de água ou alimentos contaminados. Também pode ocorrer por ingestão de cistos teciduais em carnes cruas, principalmente ovina  e suína.

Pode ocorrer, também, a transmissão vertical transplacentária. Esta ocorre quando a mulher apresenta infecção aguda durante a gestação. 

Os taquizoítos infectam e se multiplicam na placenta, chegando a circulação fetal. Outra forma de transmissão seria a reativação da doença em gestantes com infecção crônica pelo toxoplasma e imunossuprimidas.

Apesar de, na maioria das vezes, ser assintomática, a toxoplasmose pode levar a uma gravidez de alto risco por apresentar graves problemas para o feto, principalmente se a contaminação ocorrer no período entre 10ª a 24ª semanas, quando o bebê ainda está em processo de crescimento, havendo a possibilidade de:

  • Má-formação;
  • Microcefalia;
  • Macrocefalia;
  • Retardo mental;
  • Atraso no desenvolvimento neuropsicomotor;
  • Surdez;
  • Cegueira;
  • Aborto. 

Toxoplasmose congênita

As seguintes alterações podem ser encontradas no feto: ventriculomegalia, microcefalia, calcificações intracranianas, hepatoesplenomegalia, ascite, catarata, hidropsia e intestino ecogênico. O quadro clínico é encontrado em um terço dos casos e a ausência de alterações ultrassonográficas não exclui a doença.

A maioria dos recém-nascidos, não apresentam sintomas ao nascimento. As sequelas na grande parte das crianças afetadas são tardias, sendo a mais comum retinocoroidite que acomete até 70% dos infectados.

Diagnóstico

O Ministério da Saúde preconiza o rastreamento sorológico durante o pré-natal, no primeiro, segundo e terceiro trimestres, nas gestantes suscetíveis a doença. Ele é realizado com os testes imunoenzimáticos (ELISA) para a detecção de IgG e IgM contra Toxoplasma gondii.

Devido à grande taxa de falsos-positivos do ELISA para IgM, pode-se realizar também a sorologia confirmatória pela pesquisa de IgM por imunofluorescência indireta (IFI).

São  gestantes suscetíveis (IgM e IgG negativos) e gestantes imunes (IgG positivo e IgM negativo). Além dessas, pode ocorrer soroconversão, quando uma gestante suscetível apresenta no seguimento sorológico IgM e IgG positivos.

Quando a gestante apresentar IgM e IgG positivos na primeira sorologia, pode-se tratar de uma infecção aguda ou crônica, pois o IgM pode permanecer positivo por mais de um ano após a infecção. 

Nesse caso, é necessário realizar o teste de avidez de IgG. A presença de anticorpos de alta avidez é sugestivo de doença há mais de 12 semanas.

A transmissão vertical é confirmada pela realização de amniocentese entre 17 e 32 semanas, realizando-se a pesquisa do DNA do toxoplasma por PCR no líquido amniótico. Indicado em todos os casos de soroconversão materna ou sinais ultrassonográficos de Infecção fetal.

Profilaxia e tratamento

Toda a gestante que apresentar toxoplasmose  aguda deve usar espiramicina para reduzir o risco de transmissão vertical. Em gestantes suscetíveis com quadro clínico sugestivo de doença aguda, rash cutâneo e/ou linfadenomegalia, deve ser solicitada sorologia e introduzida espiramicina até a confirmação diagnóstica.

A profilaxia é realizada com Espiramicina 500mg (1.500.000 UI) 2 comprimidos a cada 8 horas. Deve ser iniciada na suspeita diagnóstica e mantida até o parto. Se descartada a infecção aguda, a profilaxia pode ser suspensa.

Gestantes imunes devem receber profilaxia nos casos de imunossupressão, como nas portadoras do HIV. Nestes casos há risco de reativação da doença com possível transmissão vertical. Essas pacientes devem ser avaliadas individualmente, de acordo com a contagem de linfócitos CD4.

Na presença de infecção fetal confirmada pelo procedimento invasivo,  o tratamento com sulfadiazina, pirimetamina e ácido folínico deve ser iniciado e mantido até o parto. O tratamento é contra-indicado no primeiro trimestre, devendo ser iniciado a partir de 15 semanas.

– Sulfadiazina 500mg, 2 comprimidos VO a cada 8 horas

– Pirimetamina 25mg, 1 comprimido VO a cada 12 horas

– Ácido folínico 15mg, 1 comprimido VO ao dia

Quando a soroconversão ocorrer a partir de 32 semanas, quando não está indicado o procedimento invasivo, o tratamento deve ser iniciado mesmo sem a confirmação da infecção fetal, devido ao alto risco de transmissão vertical.

Durante o tratamento é necessário realizar o controle materno com hemograma a cada duas semanas. Devido a alta toxicidade das drogas utilizadas há risco de alterações como anemia megaloblástica, e nesses casos o tratamento deve ser suspenso e substituído pela profilaxia com Espiramicina.

A avaliação fetal, deve ser realizada com controle ultrassonográfico a cada quinze dias, pesquisando sinais de anemia fetal como a hidropsia. Além disso, aconselha-se a avaliação de vitalidade fetal.

Cuidados para evitar a toxoplasmose na gravidez

Assim como toda doença, a toxoplasmose pode ser evitada. Para isso,  a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, Febrasgo, recomenda:

  • Não comer carne crua ou malpassada;
  • Dar preferência às carnes congeladas;
  • Não comer ovos crus ou malcozidos;
  • Beber água filtrada;
  • Usar luvas para manipular alimentos e carnes cruas;
  • Não usar a mesma faca para cortar carnes, vegetais e frutas;
  • Lavar bem frutas, verduras e legumes;
  • Evitar contato com gatos e com tudo que possa estar contaminado com suas fezes;
  • Alimentar gatos domésticos com rações comerciais;
  • Fazer limpeza diária com água fervente do recipiente em que os gatos depositam suas fezes;
  • Usar luvas ao manusear a terra ou jardim.

Importante lembrar, que o peixe não faz parte do ciclo reprodutivo do parasita toxoplasma gondii, portanto, gestantes que gostam de comida japonesa, inclusive peixe cru, podem fazer a ingestão desse alimento.